Tarde de verão
Lucas Arruda e Tiago Mesquita, 2020
Lucas Arruda e Tiago Mesquita, 2020
Não faz muito tempo que Paula Siebra começou a expor e esta é a sua primeira exposição em São Paulo. Jovem, a artista atuante em Fortaleza (CE) ainda está a definir as questões que a interessam. Embora pinte assuntos contemporâneos, o faz a partir de sugestões da melhor pintura latino-americana do século XX. Encontramos paisagens com arranjos decorativos que nos lembram a pintura de artistas como Neves Torres e Lorenzato; retratos de mulheres compenetradas, como as pintadas por Diego Rivera, Djanira e Di Cavalcanti; bem como o imaginário litorâneo de Alfredo Volpi, Oswaldo Goeldi e José Pancetti.
Não há em sua obra, contudo, certa idealização romântica do mundo rural, tampouco o impulso utópico das vanguardas do século XX. As pinturas representam cenários absolutamente comuns, que já perderam a capacidade de ser contraponto ao presente. São itens domésticos, ordinários, objetos de decoração que encontramos nas feiras da praia – garrafas com areia colorida, potes de cerâmica, jarras de ferro com arranjos de flores dentro.
Tudo parece gasto. Os resquícios do mundo mercantil, mesmo que obsoletos, residuais, habitam a memória afetiva de Paula. As construções são antigas, as flores sem viço e os contornos esmaecidos. São obras pequenas, pintadas com muita delicadeza, pinceladas suaves e pouca tinta. Aliás, o aspecto rebaixado da cor é perceptível. Algumas são ao mesmo tempo tão ralas quanto iluminadas. Brilham enquanto diminuem os contrastes. Não sabemos se o alaranjado delas é de luz ou de poeira.
Os trabalhos de Paula Siebra resistem à euforia jornalística de se lidar com a agonia do presente. São trabalhos absurdamente calmos. A relação das pinturas com os nossos tempos é indireta. Sua atitude contemplativa é uma tentativa de firmar aspectos da vida que se corroem na memória, soterradas pelo ruído, pelas exigências do mundo do trabalho, pela luz ofuscante da tarde calorenta no verão. São aquelas imagens que mal se fixam na vista quando fechamos os olhos diante dos raios do sol escaldante a queimar as nossas pálpebras.
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Lucas Arruda (São Paulo, 1983) vive e trabalha em São Paulo.
Suas exposições individuais incluem Deserto-Modelo, Fridericianum, Kassel (2019); Lucas Arruda, David Zwirner, Londres (2017); Deserto-Modelo, Indipendenza, Rome (2016); Deserto-Modelo as above, so below, Mendes Wood DM, São Paulo (2016); Deserto-Modelo, Lulu, México DF (2015); Deserto-Modelo, Pivô, São Paulo (2015).
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Tiago Mesquita é crítico de arte e professor de história da arte. Doutor em filosofia pela Universidade de São Paulo, já publicou em periódicos como Revista Quatro cinco um, Novos Estudos Cebrap, Revista Fevereiro, Folha de S. Paulo e O Público (Lisboa). Publicou os livros “Imagem Útil, Imagem Inútil”, “Rodrigo Andrade: Resistência da matéria”, “Paulo Monteiro: O interior da distância” e “Cassio Michalany: Como anda a cor”.
Não há em sua obra, contudo, certa idealização romântica do mundo rural, tampouco o impulso utópico das vanguardas do século XX. As pinturas representam cenários absolutamente comuns, que já perderam a capacidade de ser contraponto ao presente. São itens domésticos, ordinários, objetos de decoração que encontramos nas feiras da praia – garrafas com areia colorida, potes de cerâmica, jarras de ferro com arranjos de flores dentro.
Tudo parece gasto. Os resquícios do mundo mercantil, mesmo que obsoletos, residuais, habitam a memória afetiva de Paula. As construções são antigas, as flores sem viço e os contornos esmaecidos. São obras pequenas, pintadas com muita delicadeza, pinceladas suaves e pouca tinta. Aliás, o aspecto rebaixado da cor é perceptível. Algumas são ao mesmo tempo tão ralas quanto iluminadas. Brilham enquanto diminuem os contrastes. Não sabemos se o alaranjado delas é de luz ou de poeira.
Os trabalhos de Paula Siebra resistem à euforia jornalística de se lidar com a agonia do presente. São trabalhos absurdamente calmos. A relação das pinturas com os nossos tempos é indireta. Sua atitude contemplativa é uma tentativa de firmar aspectos da vida que se corroem na memória, soterradas pelo ruído, pelas exigências do mundo do trabalho, pela luz ofuscante da tarde calorenta no verão. São aquelas imagens que mal se fixam na vista quando fechamos os olhos diante dos raios do sol escaldante a queimar as nossas pálpebras.
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Lucas Arruda (São Paulo, 1983) vive e trabalha em São Paulo.
Suas exposições individuais incluem Deserto-Modelo, Fridericianum, Kassel (2019); Lucas Arruda, David Zwirner, Londres (2017); Deserto-Modelo, Indipendenza, Rome (2016); Deserto-Modelo as above, so below, Mendes Wood DM, São Paulo (2016); Deserto-Modelo, Lulu, México DF (2015); Deserto-Modelo, Pivô, São Paulo (2015).
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Tiago Mesquita é crítico de arte e professor de história da arte. Doutor em filosofia pela Universidade de São Paulo, já publicou em periódicos como Revista Quatro cinco um, Novos Estudos Cebrap, Revista Fevereiro, Folha de S. Paulo e O Público (Lisboa). Publicou os livros “Imagem Útil, Imagem Inútil”, “Rodrigo Andrade: Resistência da matéria”, “Paulo Monteiro: O interior da distância” e “Cassio Michalany: Como anda a cor”.